terça-feira, 16 de dezembro de 2008

Defesa Móvel e a Reconquista de Kharkov

Existem basicamente dois tipos de operações militares: Defensivas e Ofensivas. Embora as defensivas visem à manutenção/posse de algo (Uma cidade, uma estrada, uma colina e etc) A constante evolução da Guerra impôs também uma mudança no panorama geral da defesa. A tradicional defesa frontal e estática, que visava desgastar o inimigo pela usura, foi gradualmente perdendo terreno, outros procedimentos como a defesa em profundidade foram utilizados, tentando minimizar os impactos que a tecnologia que trouxe ao campo de batalha (foguetes, tanques, aviões) Mas mesmo a defesa em profundidade não pode suplantar plenamente o desenvolvimento dos exércitos modernos.

O Crescimento desproporcional do poder de fogo dos exércitos fez com que a principal força motriz da defesa estática – o atrito – tornar-se custosa demais para os defensores. Assim como o desenvolvimento de forças moveis e altamente treinadas fez com que esse crescimento do poder de fogo, encontrasse mãos capazes de empregá-lo. A Manutenção de unidades altamente treinadas em uma defesa passiva, seria um completo desperdício de suas potencialidades, pois estaticamente, elas perderiam a maximização do fogo proporcionada pela manobra, assim como uma defesa passiva traria efeitos indesejáveis as forças morais de um exercito. Logo o conceito de defesa passiva foi caindo em desuso. A defesa, em certos aspectos, hoje, agrega mais aspectos ofensivos do que podemos previamente deduzir.

A defesa móvel baseia-se na maximização do poder de fogo das forças da defesa, por meio tanto de defesa estática parcial (aproveitando-se das vantagens do terreno) como por meio da manobra tática das reservas visando à destruição da massa principal das forças atacantes, por meio de um esforço de único flanco, ou até de duplo envolvimento.
De forma que a iniciativa tático-estratégica não seja perdida

Apesar de os grandes exemplos de sua aplicabilidade terem sido dados durante a Segunda Guerra Mundial, o apogeu do conceito aconteceu durante a guerra fria, com a constante ameaça das forças do Pacto de Varsóvia manobrando nas fronteiras da Alemanha Ocidental, extensos trabalhos foram feitos tentando solucionar a inferioridade numérica das forças da OTAN no T.O. europeu frente às forças do Pacto de Varsóvia. Em destaque:

O FM100-5 de 1976 previa os seguintes pontos:

*Entender o inimigo (Tamanho da força agressora)

*Panorama geral de operações - Visão do campo de batalha (Visualização do esforço principal inimigo, e a detecção de pontos débeis).

*Concentração [no tempo e lugares corretos].

*Batalha com forças combinadas

*Explorar as vantagens da Defesa (relevo, fortificações, e etc).







Visualiza-se claramente na imagem acima as potencialidades da defesa móvel. No primeiro momento as forças atacantes penetram no território da defesa, as mesmas são retardadas e tem sua capacidade de deslocamento limitada pelo terreno e pelos efetivos limitados conservados em posições estratégicas, nos flancos da formação defensiva. A massa de contra-ataque então deslocasse contra o atacante exposto, invertendo os papeis e através de uma manobra de flanco utiliza o fogo para destruir a força agressora.



A Reconquista de Kharkov (1943).

Talvez não exista exemplo mais palpável do que representa a defesa móvel do que a genial Reconquista da Cidade soviética de Kharkov durante a Segunda Guerra Mundial, orquestrada pelo Marechal-de-Campo Erich von Manstein. Existiu uma opinião praticamente unânime por parte do oficialato germânico pós-SGM, de que o Modelo operacional de Manstein deveria ter sido amplamente reproduzido, e que isso poderia ter multiplicado as chances alemãs de vitória no front Leste.

Manstein, fazia parte da nova geração de generais alemães, fora o principal arquiteto do golpe de foice que nocauteou o garboso exercito francês numa campanha que durou 6 semanas, mas que fora decidida em apenas 2. Manstein, até pelos comandos que exerceu (de corpo de Infantaria na França, Corpo Panzer durante a Operação Barbarossa e de um exercito sitiou e venceu a fortaleza de Sebastopol) tinha completo domínio de todos os níveis da guerra moderna, tanto em aspectos tático-estratégicos como logísticos, tinha especial talento para operações de grande envergadura.
Manstein recebeu um exercito em pedaços, unidades mal abastecidas, praticamente desprovidas de fortificações de campo, com unidades blindadas severamente desfalcadas. Em contra partida, o moral soviético era altíssimo, eles haviam acabado de vencer o “Invencivel” VI exercito de von Paulus nas ruínas de Stalingrado, e estavam re-posicionando suas unidades para o que chamavam de contra-ataque decisivo.


A Ofensiva soviética teve um grande êxito inicial, tendo a cidade de Kharkov sido tomada no inicio de Fevereiro, a despeito das ordens do führer para que contra-atacasse imediatamente, Manstein jogou sua grande cartada, negando combate as grandes unidades soviéticas, se retirando gradualmente enquanto fustigava suas pontas de lança. Logo o ímpeto da grande ofensiva Soviética fora reduzido. Manstein então planejou a completa aniquilação da força vermelha, numa ofensiva limitada, diferente das que estavam sendo travadas no leste. A concepção de Manstein era ancorar seu flanco no rio Donetz e de aproveitar a impulsão inicial da ofensiva e sobrepujar por meio de um ataque de flanco a grande superioridade numérica soviética, e a partir daí, numa batalha de manobras, onde o exercito alemão era superior, sobrepujar o numericamente superior Exercito Vermelho.

Vemos claramente os dois pontos inicias apontados pelo FM 100-5, Manstein nega combate aos soviéticos inicialmente, reconhece o tamanho e o eixo principal das operações Inimigas. Enquanto suas forças se protegem mutuamente no flanco direito, ele reúne todas as suas reservas moveis para então através do uso concentrado e combinado de suas forças, lançar-se em direção ao principal corpo de combate Soviético. Manstein escreveu:

“Senti uma forte tentação de caçar o inimigo através do rio congelado e lhe tomar a retaguarda a oeste de Kharkov; Para ter nossas mãos livres de avançar até o Médio Don, sem perder tempo, era necessário primeiro destruir a ala sul do grupo inimigo em Kharkov, que estava fortificado em Berestovaya, ao sudoeste da cidade.
Se isto podia ser feito em vista do iminente desfecho era duvidoso. Consequentemente, o Grupo de Exércitos teria que se contentar inicialmente em buscar derrotar o inimigo em Kharkov, a oeste do Donetz.”

O Grande contra-ataque teve inicio com o I Exercito Panzer ocupando novamente as margens do Rio Donetz, o que libertava o IV Exercito Panzer de Hoth para contra-atacar rumo norte, no intento não só de aliviar a pressão sobre o Kampfgruppe Kempf como de Golpear o flanco exposto dos exércitos Soviéticos. Manstein teve absoluto sucesso em todas as suas aspirações, tendo depois de libertado do Kampfgruppe Kempf progressão semelhante ao do IV Exercito Panzer. A 13 de Março Manstein profetizou “A todo custo nossas forças devem impedir que Kharkov se converta numa segunda Stalingrado, onde todas as nossas forças de assalto estariam irremediavelmente comprometidas”. A 14 de Março Kharkov caiu sob o fogo do II SS Panzerkorp, e o Kampfgruppe Kempf também recuperou Belgorod. O que praticamente encerrou a batalha, as frentes do Donetz e do Mius haviam fundido-se numa frente única e sólida. Manstein, pela falta de cooperação do grupo de exércitos do centro não pode seguir em direção a saliente de Kursk, o que mais tarde mostrou ter sido um erro fatal.

A Brilhante operação executada por Manstein, mostrara ao Estado Maior Geral um novo tipo de conduta de operações. Brilho imediatamente ofuscado pela influencia de Hitler, e sua insistência na defesa fixa e frontal. Embora, num período posterior, durante a Guerra Fria, ela tenha-se tornado a doutrina básica da Defesa da Alemanha e do Hemisfério Ocidental.



Referencias:

Lost Victories – Erich von Manstein
Móbile Defense: Extending The Doctrinal Continuum – Major of United States Infantry, G. L. Walters.
Field Marshal Erich Von Manstein and the Operational Art at the Battle of Kharkov – Thomas A. Thompson
O Outro Lado da Colina – Sir Basil Liddell Hart
Estudos de Estratégia – Obino Lacerda Alvares

segunda-feira, 15 de dezembro de 2008

O Significado da Honra para o soldado.

A significação moral da guerra manifesta-se em tudo que aparece em conexão com ela (e não nela). Onde quer que surja um conflito na vida humana, relacionado a qualquer coisa melhor do que ganância ou crueldade cegas, de ambos os lados, onde quer que haja até o mesmo o mais tênue brilho daquilo que os homens chamam de dever, encontraremos sempre aquele sentimento misterioso e exaltado chamado honra, cuja penetrante suavidade não é suscetível de comparação, uma vez que defrontado com ela, o valor da própria vida tem o peso de uma pena. O sentimento de honra pessoal, de auto-respeito, que eleva o homem acima da condição de vida comum, não é nada mais do que uma concentração de nobreza do individuo. Para o Soldado, ela surge como uma crença sagrada e uma prerrogativa especial. O soldado zela cuidadosamente por sua honra, pois para ele, esta é a única coisa que o coloca acima da sua caricatura, o Gladiador.

Os Pacifistas procuram rebaixar o soldado ao plano de sua caricatura, pois não possuem nenhuma idéia da verdadeira natureza humana, Não possuem nenhum discernimento acerca da grandeza do sacrifício e do sofrimento exigidos pela guerra. Eles também não compreendem que existem homens que conseguem ver a morte gloriosa como a grande realização de suas vidas.

Fonte: “O Poder da Personalidade na Guerra” – Hugo von Freitag-Loringhoven, Pág. 161